A incansável atriz Laura Cardoso está, indiscutivelmente, no Olimpo das Artes Cênicas. Uma das mais talentosas de todos os tempos, respeitada de forma unânime por críticos e público, Laura Cardoso impressiona pela incrível vitalidade e amor à profissão. Conversei com Laura nos bastidores das gravações da novela “O Outro Lado do Paraíso”. Acompanhada da sua filha Fátima Baleroni, a qual esbanja simpatia e carisma, Laura é toda sorrisos.
Ivann Willig: Do alto dos seus 90 anos e ainda na atividade, ainda se sente desafiada a atuar?
Laura Cardoso: “Sempre, sempre, sempre…Eu tô sempre aprendendo, sempre aceitando desafios, durante toda a minha carreira, toda a minha vida. Essa foi a minha meta, com muito respeito pelo meu trabalho e pelo trabalho das equipes”.
IW: A senhora tem um extenso currículo de trabalhos como atriz. São mais de 50 novelas, 28 longas e 13 peças de teatro. Trabalhos que lhe renderam diversos prêmios. Em 2006, a senhora foi condecorada pelo então Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, com a Ordem do Mérito Cultural, pelo seu destaque e contribuição à cultura brasileira e, recentemente, foi premiada como melhor atriz coadjuvante no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Como a senhora avalia tantos prêmios e reconhecimento ao longo da carreira?
LC: “Os prêmios foram muito, muito importantes. O reconhecimento do pessoal de cinema, dos críticos, e principalmente do público, é muito gratificante. Eu fiquei muito feliz. O cinema é mágico. Eu gosto de cinema desde que nasci. É uma arte difícil. Não é fácil fazer cinema, dirigir cinema”.
IW: A senhora é viúva do ator, roteirista, diretor e produtor de tv, Fernando Baleroni, com quem teve duas filhas: Fátima e Fernanda. Que legado Baleroni lhe deixou através do trabalho dele, que tenha influenciado a sua arte?
LC: “Ele era um homem muito inteligente e culto. Era um lindo e ótimo ator. Foi premiado com o prêmio Saci, pelo filme “O Sobrado” (Dir: Cassinao Gabus Mendes & Walter George Durst/1956). O legado de Baleroni foi o amor, a responsabilidade, o respeito e o seu trabalho honesto e árduo. Baleroni é inesquecível.”
IW: Com tantos personagens em sua carreira, algum se destaca em sua preferência? Há algum arrependimento?
LC: “Nenhum arrependimento. Nenhum. Todos os personagens são desafiadores. Eu amei todos os meus personagens e pude dar o melhor de mim. Eu sou do signo de virgem, sou perfeccionista, sempre quero chegar à perfeição. Estou sempre criticando meu trabalho, sempre acho que poderia ter feito melhor, de outro jeito. Tô sempre querendo o que é difícil”.
IW: Mas a senhora não acha que depois de tantos prêmios e reconhecimento, já não é o retrato da perfeição?
LC: (gargalhadas).
IW: Onde Laura Cardoso se sente mais à vontade? No cinema teatro ou tv?
LC:“Em todos, em todos. Cada lugar tem uma história. No teatro, por exemplo, eu fico 12, 14 horas dentro do teatro, me sinto em casa. Gosto do palco. O palco é sagrado pra mim. A tv, eu estou, sei lá, acho que desde que ela começou aqui no Brasil. Também gosto da tv. A tv é praticamente como o cinema, uma indústria. Eu gosto de todos os ramos. Eu fiz circo, dancei, cantei…”
IW: A senhora é completa.
LC: (risos).
IW: Quando a senhora contracena com atores mais jovens, com menos experiência, isso atrapalha no jogo de cena? Existe o tal choque de gerações? Como a senhora lida com essa situação?
LC: “Não acho que exista choque de gerações. Eu amo a juventude, pois sempre nos trás ideias novas, sonhos novos, visões novas. Eu adoro contracenar com jovens. Essa carreira de ator, tem muito trabalho, muito estudo, muita dedicação. Eu só não gosto quando o jovem vem com a ilusão de que terá uma carreira fácil, cheia de luxos e mordomias. Isso pode até acontecer, mas será fruto de muito trabalho. Tem que merecer por isso. Tem que ser um profissional honesto. Tem que ser da “pesada”. Tem que ser um profissional que queira trabalhar e aprender. A maioria dos jovens que vem com ilusões, ficam “un passant”. Não continuam na carreira. Tem que gostar de verdade da arte de representar, seja onde for, no teatro, tv, cinema, circo, rádio…tem que ter vocação”.
IW: Já ouvi a senhora falar que está em constante aprendizado. Que ensinamentos a sua arte lhe ensinou e que possa transmitir aos jovens de hoje?
LC: “É muito difícil criar um personagem. Tem que dar vida à ele. O personagem tem que viver, tem que ser de verdade. Poder representar um outro “eu”, uma outra pessoa, é um mundo fascinante. Para cada personagem você tem que criar uma história de vida, com muita credibilidade”.
IW: Sei que a senhora trabalha em longas e curtas-metragens. O que lhe conquista em projetos de curtas? Como a senhora se sente sendo dirigida por novos talentos?
LC: “Como lhe disse, o jovem sempre trás novidades, sonhos diferentes. Gosto muito. O curta é especial, tão importante quanto um longa. Adoro trabalhar com diretor que entenda de cinema, tanto no longa, quanto no curta. Os dois são importantes. São especiais”.
IW: Eu acabei de dirigir um curta com a Carolina Kasting e Tuna Dwek, chamado “Escolhas”.
LC: “Nossa, a Carolina é perfeita. É uma grande atriz. Eu não conheço o seu trabalho Ivann, mas quero ver o seu filme”.
IW: Vou providenciar uma cópia pra senhora. Quem sabe a gente não faz um trabalho juntos?
LC: “Se Deus quiser”. (risos).
IW: Quem são seus ídolos cinematográficos?
LC: “Marlon Brando, Gregory Peck, Marlene Dietrich e Bette Davis”.
IW: Poderia citar 10 filmes da sua vida?
LC: “Dez? (risos). Eu vejo muito cinema, mas quero citar um que me marcou muito: Quero Viver”, com Susan Hayward, de 1958”.
IW: Se a senhora fosse um personagem de cinema, qual seria? Que filme a senhora gostaria de ter feito?
Laura Cardoso:“A Malvada”. Eu queria ter feito o papel da Bette Davis. Aliás, Bette Davis é especial. Depois de ter conquistado dois Oscars e ainda teve que pedir emprego num anúncio de jornal. Tão injusto. Ela não era linda, mas era a mais talentosa. Um ícone. Tenho livros sobre ela. Outro dia reli um. O ator é isso, deixa um legado do que ele fez, através do seu trabalho”.
Para mais informações sobre a atriz Laura Cardoso visite esta página da Wikipédia
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