No Dia da Internet das Coisas, que se comemora hoje (9 de abril), entrevistamos Paulo Spaccaquerche, presidente da Associação Brasileira de Internet das Coisas (ABINC). Nesta conversa, ele esclarece o conceito de Internet das Coisas (IoT) e explica como a associação tem trabalhado para promover esse conjunto de “tecnologias” no Brasil.
A ABINC tem como missão, entre outras coisas, fazer com que o ecossistema das empresas fornecedoras de soluções em IoT se aplique em diferentes segmentos do mercado, como, por exemplo, o sector da saúde.
Neste dia especial, Spaccaquerche aborda os principais desafios enfrentados pela Internet das Coisas – IoT – no Brasil, como a falta de tecnologia nacional e a escassez de mão de obra qualificada, bem como as oportunidades que a transformação digital oferece em diversos setores da economia, como saúde, agronegócio e cidades inteligentes. Além disso, ele comenta a atuação da ABINC junto ao governo, empresas e instituições de pesquisa, visando a criação de políticas e iniciativas que fomentem a adoção da IoT no país, bem como questões relacionadas à segurança, privacidade.
Dia da Internet das Coisas: ABINC e os desafios e oportunidades do ecossistema de IoT no Brasil
1 – Sr. Spaccaquerche, poderia nos dar uma breve introdução sobre a Internet das Coisas (IoT) e como essa tecnologia tem evoluído nos últimos anos?
Internet das Coisas, por princípio, não é uma tecnologia e sim um conjunto de tecnologias que recebe o nome de IoT, porque ela parte do princípio que você tem um device para coletar dados – que a gente chama de sensores – que passam a ser enviados pela internet, passam por uma nuvem, um repositório e você analisa, gerando informações para o seu negócio. Então, esse conjunto de passos que você dá para fazer este dado virar uma informação para o seu negócio é o que chamamos de Internet das coisas, porque tem várias coisas conectadas, como por exemplo, o sensor de uma máquina ou sensor de um agro na terra.
Paulo Spaccacherque
2 – Qual é a missão da Associação Brasileira de Internet das Coisas (ABINC) e como vocês têm trabalhado para promover a IoT no Brasil?
A própria missão da ABINC é definida claramente no nosso site e no nosso estatuto: é fazer com que o ecossistema das empresas que fornecem soluções – não necessariamente uma solução completa, pode ser a solução de um sensor, solução de uma nuvem ou de um banco de dados – se aplique em um determinado segmento do mercado. Então, vamos dizer assim: tem uma solução para a área de saúde, certo? Ela é específica para a saúde. Pode ser que ela seja usada, por exemplo, na manufatura? Pode ser que se utilize o mesmo sensor, não somente a solução. E nem sempre a solução é de uma pessoa. Às vezes, tem que juntar duas, três empresas para formar uma solução.
O que faz a ABINC? Faz com que esse ecossistema gire, consiga se conectar para fazer negócio. Esse papel da ABINC é de promover todos os players de uma maneira somatória, para que você consiga ter uma solução que atenda uma necessidade específica de negócio. Então, esse é o papel da ABINC: gerar os comitês e esse ecossistema. Temos comitês de agronegócio, manufatura, cidades inteligentes, auto e mobilidade, entre outros. São 6 grandes comitês por segmento de mercado, e tem 3 outros que são transversais, que são Redes, Segurança e Dados. Esses 3 apoiam os demais. Então, é assim que a ABINC trabalha e tem formado mão de obra no mercado, o que é importante para que a gente atenda esse ecossistema.
3 – Quais são os principais desafios e oportunidades que a IoT enfrenta atualmente no Brasil?
Os principais desafios são ter disponibilidade da parte tecnológica, que você acaba, de uma maneira de outra, tendo um trabalho de importar equipamento que não está disponível no Brasil e os preços são absurdos, o que inviabiliza alguns projetos. Então, o desafio no Brasil é ter condições de desenvolver um projeto com tecnologia nacional. Esse é o primeiro ponto. O segundo é a falta de mão-de-obra. Se não há pessoal que te ajude em todas as partes, como cientistas de dados, alguém que programe algoritmo, é difícil de achar.
Sobre oportunidade, tudo que é transformação digital é oportunidade porque a IoT promove a digitalização daquilo que é físico. Vamos dizer assim, você quer digitalizar uma cama para colher informação sobre que tipo de sono e comportamento aquela pessoa tem quando está deitada, seja no hospital ou em casa, para depois fazer uma análise e conseguir uma resposta sobre o que pode ser feito. Talvez você tenha apneia do sono, a cama recolhe essa informação. Isso a gente chama de digitalização do físico. Então, tudo que se fala em transformação digital é oportunidade. Eu acho que esse é um caminho bastante interessante.
4 – Como o desenvolvimento da IoT no Brasil se compara com outros países, tanto na América Latina quanto globalmente?
Globalmente, nós estamos bastante atrasados por causa das barreiras que temos no país, seja regulatória, alfandegária, tarifária. A tarifação no Brasil é um absurdo. Os impostos inviabilizam a maioria dos projetos. Por mais que se fale que aqui nós temos, por exemplo, o 5G, o 5G daqui não é nem metade do que é lá fora. Com relação à América Latina, estamos um pouco melhor. Entretanto, países como Argentina, Chile e até mesmo o México estão ficando mais próximos do Brasil. Eu tive uma conversa recentemente com um médico que queria construir uma ABINC no México, pois aqui a gente tinha diversas soluções para IoT, como o Plano Nacional de IoT, que lá não tinha. Mas hoje em dia já tem diversas ações nesse mundo de IoT e tem todo um trabalho que vem crescendo muito forte no México. A ABINC participa de uma entidade na América Latina que fala sobre IoT nesta região. Eles olham para o Brasil como modelo, só que eles fazem, e nós estamos parados por diversos motivos. O problema do Brasil é que se dá um passo para frente e dois para trás.
5 – Você poderia citar alguns exemplos de setores da economia brasileira que estão sendo mais impactados pela IoT e de que forma?
Eu diria que a área de saúde hoje está sendo muito bem aceita com IoT, principalmente com a possibilidade do que o 5G está fornecendo, por exemplo, a possibilidade de fazer uma rede privativa de alta velocidade e baixa latência, coisa que você não conseguia fazer com outras redes. O setor de agronegócio também está cada vez mais investindo em IoT e a área de cidades inteligentes está crescendo muito, principalmente na parte de iluminação, que é onde o pessoal começa, e depois expande para segurança, tráfego, entre outros.
6 – Em sua opinião, como a IoT pode contribuir para a sustentabilidade e melhoria da qualidade de vida no Brasil?
Pouca gente sabe que IoT atende a 85% das 17 definições dos ODS. Toda a parte de monitoramento e controle de desastres ecológicos tem soluções de IoT prontas, como para controle de esgoto. Há soluções para auxiliar cegos a saber onde estão andando com a bengala, entre outros. Há muitas soluções interessantes entregues pela IoT nessas áreas.
7 – Quais são as principais tendências e inovações que devemos esperar na área de IoT nos próximos anos?
Tendências compõem a tecnologia que está disponível para criar projetos e atender uma demanda de mercado, é o que está acontecendo. “Tendências” é você cada vez mais ter o ecossistema se juntando para oferecer uma solução, e eu já falei dessas soluções em outras perguntas. Depende muito do segmento de mercado que estamos falando, existem tendências maravilhosas em agronegócios, saúde, cidades inteligentes, varejo, automobilismo e mobilidade, principalmente com a chegada dos carros elétricos.
8 – Como a ABINC tem trabalhado com o governo, empresas e instituições de pesquisa para criar políticas e iniciativas que fomentem a adoção da IoT no país?
A gente participa do governo desde o seu início, desde quando estava sendo criado o Plano Nacional de IoT. Com o resultado do plano nacional, foram criadas quatro câmaras de atuação que são agro, saúde, cidade inteligente e manufatura. A ABINC participa em todas elas para saber como é que o governo está se definindo, como é que a gente pode se posicionar, o que a gente tem que fazer, quais são os palpites que nós damos, quais são as recomendações. Nós trabalhamos muito com relação à parte de regulamentação. O Brasil ainda está carente disso. Nós temos aí um incentivo durante 5 anos, que foi assinado em 2021. O que isso significa? Incentivo para fazer as coisas. Então, a gente está direto, a gente está com pesquisas que nós fizemos, estamos preparando outras pesquisas para mostrar. Temos parcerias com entidades como Mackenzie, Senac e Senai, para a gente formar mão de obra, fomentar e explicar, evangelizar o IoT no país. Isso não é só aqui em São Paulo. A gente tem representantes em todos os Estados.
9 – Quais são as questões de segurança e privacidade envolvidas na IoT e como a ABINC tem trabalhado para abordar esses desafios?
A ABINC sempre trabalhou diretamente com segurança, e segurança é uma coisa que não é só por causa do IoT; segurança sempre foi um problema. Então temos diversas entidades que nos ajudam com isso, e a ABINC tem um comitê específico para lidar com segurança, através de uma parceria que temos com o IoT Security Foundation na Inglaterra, para pegar as indicações, metodologias, entre outros, e discutir muito com relação ao que se tem no Brasil. Com relação à privacidade, nós trabalhamos desde o início com a implementação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Nosso diretor jurídico esteve lá no Senado diversas vezes, então a ABINC está sempre antenada e trabalhando para correr atrás desses problemas, que são coisas novas que, se você parar para pensar, surgiram por conta dessa transformação digital promovida pelo IoT.
10 – Por fim, você poderia nos contar sobre o Dia da Internet das Coisas, comemorado em 9 de abril, e como essa data pode ser utilizada para conscientizar a população sobre a importância da IoT?
O IoT Council na Inglaterra definiu o dia 9 de abril como a data mundial do IIoT. A ABINC é a representante no Brasil do IoT Council para falar sobre IoT no dia 9. Todo ano, fazemos uma apresentação e um evento voltado para comemorar o dia. Este ano, o dia 9 cairá no domingo de Páscoa, então postergamos o evento para os dias 25 e 26 de abril, onde faremos junto com a TI Inside o 7º Business Forum, discutindo todas as tendências de IoT e como estamos nos desenvolvendo nessa área. Isso é uma forma de mostrar para o mercado o que está sendo feito, como as pessoas vão enxergar IoT daqui a alguns anos e como isso faz parte do dia a dia das pessoas. Às vezes, as pessoas não percebem que estão utilizando IoT quando pedem uma comida, chamam um táxi ou trabalham com seus próprios celulares, que são tremendo de devices. Tudo isso é parte da evangelização.
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