A relação entre grandes tecnológicas e a rede social X (antigo Twitter) está a sofrer uma transformação silenciosa, moldada pela nova realidade política norte-americana. A surpreendente aproximação ocorre dois anos após fuga massiva de anunciantes devido às polémicas gestão de Elon Musk.
Quando Elon Musk adquiriu o Twitter em outubro de 2022, iniciou-se um êxodo de marcas receosas de associar-se a uma plataforma acusada de laxismo na moderação de conteúdos. Empresas como Apple, Meta e Amazon cortaram ou reduziram drasticamente os seus investimentos.
Dois fatores alteraram este cenário. A eleição de Donald Trump para um segundo mandato presidencial em 2024 e a nomeação de Musk como conselheiro próximo do presidente — acumulando o cargo de chefe do recém-criado “Departamento de Eficiência Governamental” (DOGE). Esta combinação de influência política e tecnológica está a forçar uma reavaliação estratégica das empresas.
O Wall Street Journal revelou que a Amazon lidera este movimento, retomando campanhas publicitárias no X. A decisão surpreende pela histórica rivalidade entre Musk e Jeff Bezos, fundador da Amazon, mas reflete uma priorização clara de interesses comerciais.

O dilema da Apple
A Apple mantém conversações internas sobre o tema, dividida entre oportunidades e riscos. Fontes próximas à empresa confirmam que a equipa de marketing debate três aspetos cruciais: potenciais benefícios de alcance da plataforma, receios de danos reputacionais e pressão política indireta.
Tim Cook, CEO da Apple, exige garantias formais sobre moderação de conteúdo antes de qualquer compromisso financeiro. A hesitação contrasta com o pragmatismo da Amazon, destacando divisões no setor tecnológico.
Elon Musk é uma ponte entre Washington e Silicon Valley
O estatuto de Musk como conselheiro presidencial e simultaneamente CEO de várias empresas tecnológicas alterou as regras do jogo. Esta dualidade concede-lhe um poder híbrido — influencia políticas governamentais enquanto controla plataformas críticas para comunicação digital.
Analistas apontam que empresas como a Amazon estão a adotar uma postura realista. Para além da dimensão comercial, existe um reconhecimento tático: ignorar o X poderá significar perda de acesso a decisões políticas relevantes.
O regresso cauteloso de anunciantes ao X não é consensual. Organizações de defesa da democracia digital criticam o movimento, argumentando que legitima plataformas com políticas de moderação questionáveis. Do outro lado, executivos do setor privado defendem adaptação inevitável a novos contextos políticos.
A Amazon justifica a decisão citando melhorias na segmentação de públicos-alvo, enquanto a Apple evita comentários públicos. Esta assimetria revela estratégias distintas: enquanto algumas empresas abraçam abertamente o novo cenário, outras mantêm um perfil discreto.
Nova era para o X
A plataforma de Musk ressuscita como espaço publicitário não por mérito próprio, mas por força do realinhamento geopolítico. As mudanças incluem:
- Algoritmos de recomendação redesenhados para priorizar conteúdos patrocinados
- Integração mais profunda com sistemas de pagamento da SpaceX e Tesla
Estas inovações, porém, são secundárias face ao principal motor do regresso dos anunciantes, que foi a necessidade de navegar a complexa relação entre Musk e o poder estabelecido.
O caso da Amazon poderá inspirar outras empresas de grandes dimensões, mas a cautela da Apple sugere que não se trata de um movimento unânime. O X tem dois desafios: convencer os anunciantes de que é seguro e manter a imagem de plataforma inovadora que atraiu Musk.
Num mundo onde política e tecnologia se entrelaçam de forma inédita, este recuo estratégico das tecnológicas revela mais sobre o poder de Trump do que sobre o apelo do X. A verdadeira lição? Na era da pós-verdade, até rivalidades históricas cedem à força das realidades políticas.
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