O relatório State of European Tech 2024 (SoET), publicado pela Atomico, apresenta uma análise detalhada sobre a transformação do ecossistema tecnológico europeu nos últimos dez anos.
A edição comemorativa de uma década do relatório oferece uma perspectiva aprofundada sobre os avanços no setor, bem como sobre os obstáculos que continuam a limitar o seu pleno desenvolvimento.
Evolução do ecossistema: crescimento exponencial no financiamento
Entre 2015 e 2024, as startups tecnológicas europeias angariaram mais de 400 mil milhões de euros, dez vezes o valor arrecadado na década anterior (2005-2014). Este crescimento fez com que o financiamento de capital de risco na Europa superasse o de outras regiões, apresentando uma taxa de crescimento média de 13% na última década. Em comparação, os Estados Unidos registaram um crescimento de 8%, a China 2% e o resto do mundo 10%.
Portugal também registou progressos significativos neste período. As startups nacionais captaram mais de 1,4 mil milhões de euros entre 2015 e 2024, um aumento expressivo face aos 92 milhões de euros obtidos na década anterior. Itália e Espanha apresentaram uma evolução semelhante, angariando respetivamente 7 mil milhões e 13 mil milhões de euros na última década, em comparação com os 500 milhões e 1,5 mil milhões registados entre 2005 e 2014.
No entanto, em 2024, os níveis de financiamento estabilizaram. O relatório prevê que as startups europeias angariem cerca de 42 mil milhões de euros, em linha com os 44 mil milhões obtidos em 2023. Apesar deste abrandamento, os dados refletem um ecossistema amadurecido, com oito fundos europeus a superarem os 450 milhões de euros em 2024, em contraste com apenas um em 2015. Estes fundos angariaram um total de mais de 6 mil milhões de euros este ano, demonstrando a capacidade crescente do mercado europeu de atrair investimento.
Desigualdades no financiamento e fuga de recursos
Embora o relatório identifique avanços no financiamento de startups em fases iniciais, evidencia um défice crítico na fase de crescimento. Startups nos Estados Unidos têm atualmente duas vezes mais probabilidade de angariar rondas superiores a 14 milhões de euros do que as suas concorrentes europeias. Esta disparidade deve-se, em parte, ao facto de uma em cada duas empresas europeias de grande dimensão recorrer a investidores norte-americanos para obter financiamento, o que contribui para a fuga de talentos, conhecimento e capital do continente.
Os fundos de pensões europeus também desempenham um papel limitado no apoio ao setor, investindo apenas 0,01% dos seus ativos em capital de risco global. No Sul da Europa, esta proporção é ligeiramente superior (0,014%), mas ainda insuficiente para colmatar as necessidades do ecossistema.
O impacto do talento na tecnologia europeia
O número de trabalhadores no setor tecnológico europeu aumentou substancialmente na última década, passando de 1 milhão em 2015 para 3,5 milhões em 2024, um crescimento equivalente ao registado nos Estados Unidos até 2020. Portugal viu o número de empregados no setor crescer de 5.200 em 2015 para 20.700 em 2024. Espanha e Itália registaram progressos ainda mais significativos, com aumentos para 175.000 e 167.000 trabalhadores, respetivamente.
A inteligência artificial (IA) é uma das áreas que mais beneficiaram deste crescimento. Nos últimos dez anos, o número de funções relacionadas com IA aumentou seis vezes na Europa, com Espanha a registar 30 mil vagas ativas nesta área em 2024. Este aumento reflete a capacidade das instituições académicas europeias em formar talentos qualificados para responder à crescente procura.
Inovação tecnológica e sustentabilidade em destaque
A Europa consolidou-se como líder em investimentos para um futuro sustentável. Atualmente, 21% do capital investido no continente é destinado a projetos relacionados com sustentabilidade, o dobro do valor registado nos Estados Unidos (11%). A gestão de carbono, em particular, registou o maior crescimento na sua quota de financiamento na fase de arranque, subindo 39 posições no ranking da Atomico desde 2015.
A área de deeptech, que inclui a inteligência artificial, representa agora 33% do financiamento total na Europa. Nos últimos dez anos, as startups europeias de deeptech angariaram mais de 87 mil milhões de euros, ficando atrás dos Estados Unidos (270 mil milhões) e da Ásia (114 mil milhões), mas destacando-se pela qualidade do talento e pela inovação produzida.
Desafios à diversidade e inclusão
Apesar dos avanços no setor, a diversidade e inclusão continuam a ser desafios no ecossistema tecnológico europeu. O relatório aponta progressos na diversidade de equipas fundadoras, mas o financiamento destinado a startups exclusivamente femininas permanece limitado. Equipas lideradas por mulheres captam apenas 1,7% do capital em rondas de Série B e seguintes, um valor que se mantém praticamente inalterado na última década.
Conclusões e projeções para a próxima década
O relatório SoET conclui que o ecossistema europeu pode alcançar um valor total de 7 mil milhões de euros até 2034, suportado por uma força de trabalho tecnológica que poderá atingir os 20 milhões de pessoas. Para concretizar este potencial, será necessário resolver o défice de financiamento na fase de crescimento, aumentar a confiança no mercado interno e reforçar a colaboração entre investidores, instituições públicas e fundadores.
Apesar dos desafios, os dados da última década demonstram que a Europa está bem posicionada para liderar a inovação tecnológica global, com um ecossistema em crescimento e cada vez mais maduro.
O relatório State of European Tech 2024 (SoET) apela a um esforço conjunto para manter o progresso e enfrentar os obstáculos remanescentes, garantindo a competitividade do continente no cenário internacional.
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