No decorrer dos últimos anos, as denominadas empresas Fintech têm olhado para Portugal como um dos locais ideais no espaço europeu para sediarem os seus negócios, nomeadamente no segmento de open banking. A isto não será alheio o bem conhecido “clima português”, mas não podemos ignorar todo um conjunto de condições favoráveis com o potencial de ajudar estas empresas a florescer e alcançar o sucesso.
O ecossistema português de startups tem ainda uma natureza bastante jovem, mas talvez isto mesmo sirva como uma das grandes mais-valias do país. Portugal tem cerca de 10 milhões de habitantes, o que se traduz num mercado pequeno mas com um ritmo acelerado.
O facto de estarmos a falar de um país relativamente pequeno pode muito bem ser visto como uma debilidade transformada em virtude. Um ecossistema de dimensões reduzidas, mas vibrante, encoraja as startups a considerar os mercados internacionais desde a sua génese, algo que certamente diferencia Portugal dos demais concorrentes.
Ao contrário do que acontecerá em países com outra robustez económica, as companhias que escolhem Portugal para estabelecer os seus principais pólos de negócios têm forçosamente de pensar globalmente desde cedo, e isso pode provar-se vital para o desenvolvimento e validação de produtos.
Mão de obra muito qualificada e salários competitivos
Talvez o maior motor desta atração das Fintech em relação a Portugal seja o acesso à mão de obra ultra-qualificada, sem que isso se traduza necessariamente em salários muito elevados. Os portugueses têm acesso relativamente fácil ao ensino superior, com algumas das instituições nacionais a serem reconhecidas internacionalmente como das melhores do Velho Continente.
Pode pensar-se que este acesso “fácil” à educação universitária terá, porventura, um efeito nefasto na qualidade dos recursos humanos, mas isso não podia estar mais longe da verdade. A falta de oportunidades de trabalho adequadas e os salários baixos fazem com que Portugal exporte alguns dos seus melhores talentos para países de ponta a nível mundial.
Este facto, por si só, deveria servir como exemplo maior do porquê das Fintechs, principalmente aquelas ligadas ao open banking, estarem agora a descobrir o enorme potencial do país. O povo português é reconhecido pela sua resiliência em cenários de alta pressão e condições desfavoráveis, o que resulta numa criatividade ímpar, capaz de levar novos conceitos para patamares anteriormente inimagináveis.
Web Summit e Fintech Hubs como forma de atrair investimento no open banking
O investimento de Portugal na tecnologia reflete-se também no grande número de eventos dedicados que têm lugar no país. Talvez o mais notável seja mesmo o Web Summit, que encontrou na capital a sua residência permanente desde 2016.
Fundada em 2009 por Paddy Cosgrave, David Kelly e Daire Hickey, esta conferência tecnológica era originalmente realizada em Dublin, na República da Irlanda, mas o governo português trouxe-a para Lisboa. O evento tem sido repetidamente elogiado como um tremendo sucesso, ajudando as startups a estabelecer ligações e facilitando o acesso a novas oportunidades de investimento.
Mais ainda, existe um reforço significativo de iniciativas como a criação de Fintech Hubs, desenhados com o objetivo de permitir a colaboração entre empresas mais maduras e outras em início de vida. A empresa de pagamentos euPago está na origem do maior centro Fintech de Portugal, localizado na cidade do Porto, sendo apenas uma de várias apostas do género.
O objetivo deste pólo é acolher cerca de 80 outras Fintech nos escritórios da euPago, permitindo-lhes aceder aos recursos da empresa de forma a facilitar a perseguição de novas oportunidades de negócios na vertical de sistemas de pagamentos. A cooperação entre empresas é vista como absolutamente essencial para o desenvolvimento e testagem de novas ideias, que por sua vez vão abrir caminho à inovação e novos fluxos de receita.
Tudo isto ajuda a colocar Portugal no mapa europeu de open banking, mas há ainda um longo caminho a percorrer. Este pequeno país ainda não tem a capacidade necessária para competir com ecossistemas como o Reino Unido ou França, com alguns analistas a sugerirem até que Portugal estará cerca de uma década atrás destes mercados principais. Os mesmos reconhecem, no entanto, que estamos perante um ecossistema em rápido crescimento durante os últimos anos.
Algumas das mais proeminentes Fintechs portuguesas:
- Yoonik (Pagamentos e Transferências)
- Anachron Tech (Finanças Pessoais)
- Habit Analytics (Insurtech)
- Lovys (Insurtech)
- LOQR (Regtech e Cibersegurança)
- Alfredo (Imobiliário)
- Doutor Finanças (Finanças Pessoais)
- NBanks (Mercados de Capital e Gestão de Riqueza)
- Paylend (Finança Alternativa)
- Hapi (Empréstimos e Crédito)
- Fraudio (Pagamentos e Transferências)
- Anchorage Digital (Blockchain e Criptomoedas)
Existe ainda a questão sobre como competir adequadamente com mercados emergentes dentro do open banking como os dos países bálticos, com a Estónia, Lituânia e Letónia em franca ascensão. Isto é cada vez mais difícil para Portugal, dado que o país não é tão atrativo quanto outros no que diz respeito a questões fiscais, o que leva algumas empresas a preferirem outras paragens em busca de maiores benefícios.
O papel da adoção da norma PSD2 no unicórnio Fintech português
É importante nesta fase reiterar o significado de open banking. Este conceito permite que empresas prestadoras de serviços de pagamentos (TPPs) tenham acesso a informações financeiras dos consumidores através de APIs (Interface de Programação de Aplicações). Este acesso é apenas permitido com expressa autorização do cliente, condição essencial para o estabelecimento de uma relação de confiança entre as partes.
Com acesso a estes dados, os prestadores de serviços de pagamentos open banking conseguem oferecer produtos refinados, ajustados às necessidades específicas de cada cliente. Melhor ainda, isto torna os serviços financeiros mais acessíveis e seguros do que nunca.
O acesso a informações sensíveis tem, necessariamente, de ser regulado. Com isso em mente, a União Europeia colocou em cima da mesa a PSD2 (Diretiva de Serviços de Pagamentos Revista), uma legislação para modernizar os serviços bancários, tornando-os não só mais seguros mas também mais transparentes. Esta diretiva tornou-se obrigatória em Portugal em setembro de 2019, contribuindo para a expansão do ecossistema de open banking do país. Apesar de poder parecer de alguma forma irrelevante, o facto da PSD2 ter sido adotada em Portugal desde muito cedo abriu a porta às plataformas de Open API.
A título de exemplo, o SIBS API Market garantiu aos prestadores de serviços de pagamentos acesso a 95% das contas bancárias nacionais, cobrindo tópicos que vão desde a iniciação de pagamentos às informações de conta.
A rápida implementação estará intimamente ligada ao facto de Portugal ter sido sempre um país pioneiro no que diz respeito a formas de processar pagamentos ou aceder a dinheiro de forma imediata, através de plataformas como a Via Verde ou a Rede Multibanco. O povo português é, por isso, menos resistente à inovação financeira, o que estabelece um cenário favorável para disruptores, pensadores menos convencionais e para o estabelecimento de plataformas open banking.
Infelizmente, não existem ainda muitos prestadores de serviços de pagamentos open banking registados em Portugal. Não faltam, porém, empresas estrangeiras a operar em território nacional.
Empresas como a Tink, Arcopay ou Nordigen têm preenchido essa lacuna, ajudando a expandir mentalidades e a assegurar que todos se envolvam nesta nova forma de pensar sobre finanças que é o open banking.
Portugal está no caminho para expandir o mercado de open banking ao longo dos próximos anos, e o interesse crescente neste tópico deixa poucas dúvidas. O objetivo de se tornar na Capital Europeia das Fintech parece cada vez mais possível, especialmente agora que mais bancos tradicionais deixam de olhar para o open banking como uma ameaça.
Em vez disso, encaram este conceito como um aliado que os ajudará no processo de modernização, contribuindo até para uma harmonização entre produtos e abordagem centrada no cliente.
Com engenheiros altamente qualificados, salários competitivos e um interesse crescente no espaço tecnológico, Portugal define-se como uma nova terra de oportunidades para as Fintech que desejam estabelecer-se na Europa e partir à conquista de outros mercados.
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