Eu sempre fui o miúdo chato. Vocês sabem, aquele que gosta de implicar com o status quo. O puto irritante, que grita a plenos pulmões que jogar Pokémon Red é tão mainstream, comparado com o Digimon World. Se me perguntarem algo como, então, já experimentaste o novo modo online do Metal Gear Solid V, responderei que não, pois estive ocupado a preparar uma nova estratégia no Bravely Default que consiste numa equipa com um Ninja, uma Spiritmaster, uma Monk e um Singer. Perdi-vos logo no não, certo?
No fundo, posiciono-me como um “true gamer”. E não há nada, verdadeiramente nada, que simbolize mais um “true gamer” do que não tocar nas sementes diabólicas destruidoras de toda uma indústria artística – jogos freemium. Dentro deste poço grotesco, borbulham autênticos esbirros do Senhor das Trevas, cegos pela lux frágil (eh, eh) de produtos malévolos como Angry Birds ou Clash of Clans. Mas nenhum destes se equipara à semente do mal, Candy Crush.
Pois o seu nome basta para fazer tremer dezenas e dezenas de “true gamers”, receosos de que este clone do Bejeweled recheado de gomas venha tapar o espaço para que os JRPG’s que ninguém joga e os Indies perdidos no fundo do Steam possam florescer. Eu fazia parte desta equipa, com muito afinco. Resisti sempre à tentação de descarregar qualquer um destes jogos, munindo o meu smartphone com todos os Final Fantasy e jogos de Tower Defense que podia. Até a Sra. Duarte Mendes (a minha esposa, by the way) o ter descarregado.
E ter jogado perto de mim.
E ter encravado num nível, proferindo logo as palavras mágicas: Amor, queres tentar tu?
Eu tentei. Juro por tudo que tentei. Passei o nível, li as mensagens de apoio reconfortantes da bonequinha, ouvi os Juicy! e os Sodalicious!, desdramatizando-os por serem apenas parte da conspiração para me fazer comprar itens dentro do jogo e arruinar a indústria dos videojogos. Mas continuei a ouvi-los, enquanto empilhava gomas atrás de gomas atrás de gomas. Arrepiei-me. Estava a divertir-me. Terá sido o equivalente ao que um tipo completamente insensível sente depois de chorar com o Papuça e Dentuça.
Inicialmente pensei que me iria safar bem. Afinal, só o jogava quando estava perto da minha esposa e podíamos desfrutar do Candy Crush juntos. Percebi o quão falaciosa era esta premissa quando dei por mim a soltar um palavrão no autocarro, depois de perder pela 5ª vez consecutiva no mesmo nível. Sozinho. Com ar de alucinado.
Serve isto para dizer que, caros “true gamers”, aprendi três coisas com esta experiência. Primeiro, o jogo está genuinamente bem construído, tanto ao nível do desafio – por vezes demasiado apoiado no aleatório para que a experiência seja de topo – como ao nível da jogabilidade. Existem puzzles que trocam as voltas aos cânones deste género, onde a direcção da queda das peças varia consoante o líquido presente no ecrã, por exemplo.
Segundo, nada mudou nos meus hábitos saudáveis para com os videojogos. Continuo a treinar a minha equipa no Pokémon White 2 que estou para terminar há que séculos, enquanto vou terminando a análise do Heart of Stone para o Witcher 3 e do Football Manager 2016 (que terão oportunidade de ler, brevemente, no TecheNet).
Terceiro, o segredo está na geração que o joga. Tenho a sorte de ser da geração de 90, a geração da Mega Drive vs SNES. Sei dar valor a um jogo que não me dá a oportunidade de pagar 5 euros para ganhar uma vida extra, porque ainda me lembro dos calos nas mãos ao tentar acabar jogos como o Quack Shot, Aladdin ou Streets of Rage, sem saves, sem passwords, sem nada.
Portanto, se a ocasião surgir, deixem-se levar pela Soda do Candy Crush. Quem sabe surpreendem-se a vós próprios com o quanto se poderão divertir com o colosso da King.
Só não sejam autênticos noobs como eu, que estou há uma semana no nível 33. Que nem sequer é difícil.
A sério, se puderem dar dicas para jogar melhor, eu agradeço. Tenho uma esposa para impressionar.
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