A origem da água na Terra é um tema que intriga a ciência há muito tempo e que já gerou algumas hipóteses, sem que se chegasse a um consenso. Agora, a sonda Rosetta, da Agência Espacial Europeia (ESA), forneceu dados capazes de descartar a ideia de que os veículos que trouxeram esse precioso líquido, que preenche nossos oceanos, lagos e corpos, tenham sido os cometas.
Sabemos que os elementos que formam a água, hidrogênio e oxigênio, estavam contidos na densa nuvem de gás que formou o Sol e os planetas do Sistema Solar há 4,5 bilhões (mil milhões) de anos. O colapso gravitacional da nuvem criou um disco de poeira e gás incandescentes, e os planetas nasceram das colisões entre os mesmos. Porém, a porção interior do disco, mais próxima ao Sol, seria quente demais para abrigar muita umidade, de onde se conclui que os planetas rochosos — justamente os de maior proximidade com o astro-rei — teriam sido formados praticamente sem água.
Sendo a Terra um dos planetas rochosos acima mencionados, cabe-nos investigar a origem da água no planeta. Uma hipótese plausível é a de que a água tenha sido transportada por objetos formados em órbitas distantes do Sol — cometas e asteroides — que com a Terra tenham colidido, e uma maneira de investigar isso é analisar a composição isotópica do hidrogênio da água, tanto no planeta quanto em objetos extraterrestres. (Isótopos são variantes de um elemento químico determinadas pela quantidade de nêutrons/neutrões do núcleo.)
Um estudo publicado ontem (10 de dezembro) na Science concluiu que a hipótese de que a água tenha sido trazida pelos cometas está equivocada, e que os asteroides são melhores candidatos à função.
Dados coletados pelo espectrômetro ROSINA, um dos instrumentos da sonda Rosetta, que orbita o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, levaram a pesquisadora Kathrin Altwegg, da Universidade de Berna (Suíça), e sua equipe a concluir que a água do cometa contém uma proporção de deutério (átomo de hidrogênio que possui um nêutron) sobre o total do hidrogênio — razão D/H — 3 vezes maior do que a água dos oceanos da Terra. A diferença proporcional invalida a ideia de que objetos como o 67P tenham sido a fonte da água do nosso planeta.
De maneira análoga, estudos que analisaram a composição da água de alguns objetos provenientes da Nuvem de Oort (gigantesca nuvem esférica de detrito espacial, situada nos limites do Sistema Solar, da qual acredita-se que venha parte dos cometas; a outra parte advém do Cinturão de Kuiper, anel de objetos localizado além da órbita de Netuno) sugerem que a mesma possua composição isotópica mais parecida com a do Churyumov-Gerasimenko do que com a da Terra.
A hipótese de que a água tenha vindo com os cometas ganhou força em 2011, quando um estudo apurou que a água de um objeto do Cinturão de Kuiper possui razão D/H semelhante à da Terra. No entanto, a pesquisa possibilitada pela Rosetta parece dizer que o caso citado acima se trata de apenas uma exceção.
Altwegg explica que, se os asteroides de hoje, encontrados em um cinturão situado entre Marte e Júpiter, possuem pouca água, este provavelmente não foi o caso no passado. Na verdade, evidências geológicas sugerem que um intenso bombardeio de asteroides ricos em umidade tenha atingido a Terra há cerca de 4 bilhões de anos, argumenta a pesquisadora. Além disso, a viagem de um asteroide até aqui teria sido muito mais fácil, uma vez que distam menos da Terra do que os objetos dos confins do Sistema Solar.
A equipe que opera a Rosetta planeja que a sonda voe diretamente sobre, no mínimo, um jato de material expelido pelo 67P enquanto este se aproxima do Sol, a fim de confirmar os resultados atuais. Outras missões espaciais pretendem analisar a composição isotópica da água dos cometas (por exemplo, a missão Hayabusa 2, lançada recentemente pela ANXA, Agência Espacial Japonesa), e as informações obtidas auxiliarão a determinar a origem da nossa água.
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