Pesquisadores já haviam sugerido que pessoas que sofrem de dores crônicas morrem relativamente cedo devido ao câncer, por exemplo. Agora, um novo trabalho conclui que os camundongos dos quais está ausente determinado tipo de receptor de dor vivem mais do que os demais, além de seu metabolismo conservar-se mais vigoroso.
Uma equipe liderada por Andrew Dillin, da Universidade da Califórnia em Berkeley, demonstrou que camundongos machos geneticamente modificados para não possuírem os receptores de dor TRPV1 vivem cerca de 12% mais em relação aos roedores normais. O efeito da ausência do TRPV1 — ativado em resposta a temperaturas elevadas e à capsaicina, composto ativo que deixa as pimentas “picantes” — sobre as fêmeas foi ainda mais significativo: o tempo de vida delas aumentou em 16%, novamente, em relação aos animais não modificados.
A investigação das razões desse aumento da expectativa de vida levou os cientistas às células beta do pâncreas, responsáveis pela síntese da insulina, hormônio que regula o nível de glicose no sangue. Ocorre que os receptores TRPV1 se aglomeram ao redor das células beta de animais normais e, quando estimulados pela dor, liberam o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (doravante CGRP, sigla para a expressão anglófona calcitonin gene-related peptide) que, por sua vez, bloqueia a liberação da insulina na pâncreas.
Desse processo resulta uma inflamação que se acumula conforme os roedores mais velhos passam a secretar mais CGRP, segundo Celine Riera, pesquisadora do laboratório de Dillin, levando a problemas metabólicos.
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Portanto, o estudo sugere que os ratos mais velhos desprovidos de receptores TRPV1 possuam um metabolismo jovem e vigoroso, com maior eficiência no gasto de energia e consumo de oxigênio, corroborando as conclusões de um trabalho prévio (do ano de 2008; imagem ao lado), segundo o qual os roedores de laboratório modificados pela ausência do TRPV1 metabolizam alimentos com maior eficiência, ganhando menos peso do que os camundongos normais a partir de uma mesma dieta.
Apesar da correlação positiva entre a eficiência metabólica e a ausência dos receptores TRPV1, estes fazem falta: drogas experimentais desenvolvidas para combatê-los expuseram os pacientes a situações de perda de sensibilidade à dor e de regulação da temperatura, deixando-os dispostos a se arriscarem com temperaturas extremas — ocasionando hipotermia e queimaduras. Dessa forma, novas abordagens farmacêuticas têm procurado agir diretamente sobre o CGRP para inibir o envelhecimento, pois este seria um caminho de mais fácil ajuste por parte da manipulação farmacológica, explica Riera.
Dillin, cujo estudo figura na edição de ontem (22) do periódico Cell, aponta esses riscos enquanto justificativa evolutiva para o fato de a seleção natural ter mantido a capacidade de sentir dor no portfólio das habilidades dos mamíferos. “A dor é muito importante para os animais selvagens e provavelmente supera os benefícios de um metabolismo juvenil”, afirma.
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