
em artigos publicados em janeiro, a dra. Haruko obokata declarou ter sido capaz de criar células-tronco embrionárias a partir de um método inovador. Crédito: asahi shimbun/getty
Dois artigos, publicados na revista científica Nature em 30 de janeiro de 2014, foram motivo de uma controvérsia que culminou em uma investigação e posterior julgamento. Nas dissertações em questão, a pesquisadora Haruko Obokata, do instituto japonês RIKEN, e sua equipe apresentaram um modelo de geração de células-tronco embrionárias considerado, então, revolucionário por sua rapidez e eficácia.
A técnica empregada pelos membros do RIKEN Center for Developmental Biology (CDB), a aquisição de pluripotência desencadeada por estímulo (STAP), consistiu na aplicação de um tratamento por solução acídica sobre células maduras de camundongos, que se transformaram em células pluripotentes, ou seja, passaram a ter a capacidade de formar qualquer tipo de tecido do corpo.
No entanto, alguns problemas logo foram identificados pelos leitores dos artigos, seis dos quais foram analisados por um comitê composto por cientistas do RIKEN, pesquisadores universitários e um advogado. Duas das questões levantadas levaram à conclusão de que a Dra. Obokata manipulou dados de maneira intencional para iludir o público de que seus resultados estavam corretos, fato que o comitê considerou má conduta científica.
Manipulação de ótica
Um problema dos artigos de autoria de Obokata diz respeito à figura que retrata géis de eletroforese (uma técnica de separação de moléculas), na qual uma faixa da imagem foi substituída por outra, de outra figura, cuja visualização estava mais clara, segundo a pesquisadora. Outra imagem problemática marcaria o amplo escopo de ação das células desenvolvidas em laboratório. A mesma imagem, inicialmente publicada na tese de doutorado de Obokata — na qual lê-se que as células foram geradas através da pressão direta sobre as membranas celulares com o uso de um instrumento —, figurou nas páginas da Nature, com a intenção de ressaltar a capacidade de pluripotência. Porém, sua legenda foi alterada, passando a dizer que as células haviam sido produzidas pela aplicação do ácido.
Na visão do comitê, ambas as alterações foram intencionalmente enganosas.
ryoji noyori, presidente do riken, faz reverência na coletiva de imprensa em que o instituto anunciou os resultados da investigação sobre a pesquisa de obokata. Foto: eugene hoshiko/ap/press association images
A cientista contesta o julgamento “inaceitável”, afirmando que o uso da segunda imagem foi acidental, e que já havia enviado uma nota de correção à Nature. Apesar de não ter aparecido na conferência na qual o comitê anunciou seus resultados, ela comunicou (por escrito) que pretende apelar da decisão.
No entanto, o comitê não apreciou questões relacionadas ao funcionamento — ou não — do método de STAP. O diretor do colegiado, Shunsuke Ishii, biólogo molecular do instituto RIKEN, ponderou que tal apreciação estaria “além do escopo” da investigação.
Outro foco da averiguação foi quanto ao envolvimento de três coautores dos estudos nas manipulações: Yoshiki Sasai e Hitoshi Niwa, do CDB, e Teruhiko Wakayama, que deixou o RIKEN no ano passado. Sasai e Wakayama não foram considerados culpados por envolvimento na má conduta científica, embora tenham tido responsabilidade pela falha na verificação dos dados. Já a participação de Niwa iniciou-se muito tarde para que sua possível parcela de culpa pudesse ser apurada.
Em seu pedido de desculpas, Sasai buscou confirmar a validade da STAP: “[m]esmo que os dados problemáticos sejam removidos, há alguns resultados que só podem ser explicados pela STAP”, disse.
O RIKEN empossará uma comissão para impor as punições, mas os esforços de investigação se aprofundarão durante o próximo ano, quando uma equipe de pesquisadores do CDB testará a tecnologia de aquisição de pluripotência desencadeada por estímulo, tendo seus resultados verificados por um terceiro grupo. Isto é de suma importância, haja vista a dificuldade na reprodução das conclusões de Obokata em outros laboratórios. Kenneth Lee, biólogo da Universidade de Hong Kong, tentou reproduzi-los aplicando o protocolo descrito pela pesquisadora da forma mas estrita possível, mas os 4 experimentos acabaram em erro.
Perguntado se o RIKEN deveria gastar mais um ano tentando produzir células STAP, Lee conclui que “faz sentido — mas não com o método dela”.
A Nature não proferiu muitos comentários a respeito do julgamento, mas comunicou levar “todos os problemas relacionados a esses artigos muito seriamente”, e que “está conduzindo sua própria avaliação e considerando os resultados da investigação do RIKEN”.
Fonte: Nature
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